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quarta-feira, abril 26, 2006

Tratado sobre a violência

Marcas da Violência (A History of Violence, 2005, David Cronenberg)

Viggo Mortensen and Maria Bello in New Line Cinema's A History of Violence

O TEXTO A SEGUIR CONTÉM ENORMES SPOILES A RESPEITO DA TRAMA
Se fosse somente um filme de ação, com o único intuito de divertir, Marcas da Violência já se sairia muito bem nessa proposta. Mas David Cronenberg possui cerébro suficiente para criar algo superior a isto, algo cheio de significados. Primeiramente, o filme surge como uma crítica cheia de ironia ao esteriotipo imposto sobre a família norte-americana (nesse ponto Cronenberg acerta em tudo; seja na composição das casas ou no filho que salva seu time de beisebol no último minuto). A coisa toda fica ainda mais interessante quando esse sonho americano que a família Stall vive vai sendo desconstruído, e é aí que o tratado sobre a violência que Cronenberg se propõe a fazer entra cada vez mais em jogo: no filme, assim como na vida real, o que move as personagens é a violência, todos estão sujeitos a ela, e até mesmo o mais bonzinho, o mais pacifista pode vir a se corromper, porque a violência é um ciclo, que, quando se inicia, nunca acaba.

Marcas da Violência também surge como um estudo sensacional sobre o seu protagonista, Tom Stall (que é, desde já, um dos mais memoráveis personagens dessa década). É um homem que tenta manter uma máscara, mas quando ela cai toda a verdade sobre ele é revelada, porque a nossa natureza não pode ser apagada simplesmente (o que o transforma em uma espécie de anti-herói). Há uma cena no filme, no seu clímax, que Tom Stall (vivido pelo Viggo Mortensen, numa das melhores interpretações do ano passado) conversa com seu irmão (vivido por William Hurt, muito bem em cena): é um dos momentos-chave da produção, a cena do acerto de contas, em que Tom Stall se transforma por completo em Joey Cusack. Mas, como se não bastasse, logo após essa cena temos o provavelmente melhor momento do filme: a família reunida na mesa de jantar, momento silencioso, ninguém fala nada, um close em Viggo Mortensen com olhar de quem pede perdão, a tela escurece, o filme acaba. Grande desfecho para um filme melhor ainda.
Ouvindo: Bob Dylan - Shelter From the Storm

8 Comments:

  • At 3:58 PM, Blogger Gustavo H.R. said…

    Um dos filmes imperdíveis que não vieram para cá... Desse não desisto, pego em DVD; então não dá para ler o texto.

    Mas é filme cinco estrelas, certo?

     
  • At 4:27 PM, Anonymous Anônimo said…

    Gustavo, má noticia para você: o filme veio em fullscreen. Mas em relação a extras a edição tá até boa (mas, infelizmente, o principal veio mutilado). Ah, e é quatro estrelas, quase cinco.

     
  • At 6:21 PM, Anonymous Anônimo said…

    Marcas da Violência, de David Cronenberg, é o filme mais injustiçado do ano que passou. Não consigo entender o que as pessoas viram em O Segredo de Brokeback Mountain, de Ang Lee. Aquela vaga entre os cinco indicados era, na minha opinião, de Cronenberg. O filme é irretocável, bem idealizado até o último fotograma (e olha que trata-se da adaptação de uma graphic novel!) e conta com interpretações interessantíssimas de Ed Harris, William Hurt e, inclusive, de Viggo Mortensen (que nunca chamou minha atenção como artista até então). Vale a pena pelo roteiro e como idéia geral concebida. Abraços e até breve.

     
  • At 10:59 PM, Anonymous Anônimo said…

    Um homem e uma cafeteira - antológico, uma das coisas inesqueciveis da década.
    Gosto muito tb da cena inicial, até um pouco mais que a final. Sobre o encontra dele com William Hurt acho outro ponto de gênio. Tem uma pequena parte que sempre me lembro:
    William pergunta ao irmão Viggo pq ele não apreceu mais. Aí a camera em close mostra op rosto de Viggo que não fala nada, mas podemos ver escrito na sua testa: "se eu aparecesse era óbvio que vc me mataria. O que tb vai tentar fazer agora". Viggo da um sorrisinho ironico e senta-se. Genial.
    Um homem e uma cafeteira. Um homem e uam cafeteira!!!!!

     
  • At 11:44 AM, Blogger Gustavo H.R. said…

    Que péssima notícia. Consumidor brasileiro parece ser indigno de bom tratamento por essas produtoras. De qualquer forma, deve valer uma alugada. Estou curioso para saber o que há de tão "profundo" e importante nesse filme.

    OFF-TOPIC: "O PLANO PERFEITO" é realmente a maior brasa. ;-)

     
  • At 1:46 PM, Blogger Unknown said…

    Como disseram acima, ignorar Marcas da violência nesse Oscar foi uma das maiores injustiças do ano passado. O filme bate qualquer Crash ou Brokeback Mountain da vida.

     
  • At 3:45 PM, Anonymous Anônimo said…

    Oi. Gostaria de parabenizar pelo texto, está realmente mágico. Se possível, poderia fazer um texto sobre: O Novo Mundo, de Terrence Mallick e Drugstore Cowboy, de Gus Van Sant. Agradeço a atenção.

     
  • At 6:48 PM, Anonymous Anônimo said…

    Cara, concordo com vc sobre esse filme. Cronemberg ultrapassou limites ao transformar uma aparente simples história de ação em uma visão sobre como uma familia pode lidar com uma situação extrema e desconhecida. E sobre o quanto conhecemos as pessoas com quem nos relacionamos e coisas do tipo. Realmente um filme excelente com uma grande atuação de Mortensen.

     

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